Ponte de Ferro sobre o Zêzere
A Barca da Passagem
Durante séculos, a travessia de pessoas, animais e mercadorias de uma para a outra margem do Zêzere fez-se através de uma barca de passagem.
Dado que o rio serve de limite aos concelhos de Constância e de Vila Nova da Barquinha, a responsabilidade pela manutenção dos cais e do funcionamento da barca, bem como o direito de arrecadar o produto do seu arrendamento cabiam a ambos os municípios em partes iguais. No entanto, dada a proximidade da sede do concelho de Constância, era a Câmara Municipal deste concelho que diretamente administrava tão importante serviço.
Do lado de Constância existia um cais, a uns duzentos metros para montante do local onde agora está a ponte, num sítio onde o rio é um pouco mais estreito. O cais desapareceu há muito tempo, embora o local ainda hoje continue a ser designado Porto do Canto da Milharada.
Os direitos da barca de passagem eram arrendados pelo município a um particular que os arrematava em praça pública, por um período de tempo determinado, comprometendo-se a pagar uma renda, a manter a barca em bom estado, a ser zeloso no serviço e correto para com o público e a não cobrar aos passageiros mais do que o estipulado pela tabela de taxas estabelecida pela Câmara.
A barca de passagem era um serviço que, por norma, convinha às três partes envolvidas: ao arrematante que cobrava as passagens, às Câmaras que arrecadavam a renda e às populações que assim podiam atravessar o Zêzere, nesse tempo bem mais caudaloso do que agora por não haver ainda barragens a controlar o caudal.
O serviço era de tal importância que a Câmara de Constância tinha então um vereador com o pelouro das barcas – que na vila eram três: esta do Zêzere, um bote que fazia a ligação à estação do caminho de ferro da Praia do Ribatejo e a barca do Tejo para Constância Sul, a única que sobrevive no nosso tempo.
O movimento era constante e muito intenso, a avaliar pelo rendimento que a barca dava e que era significativo. Mas a barca do Zêzere era só uma, havia que esperar a vez, às vezes tinha de se aguardar bastante tempo para se atravessar um rebanho ou uma manada de vacas e, sobretudo, havia determinados carros de maiores dimensões que, por não caberem na barca, não havia forma de os fazer passar para o outro lado.
E havia ocasiões, em anos mais invernosos, em que a travessia ficava mesmo suspensa por vários dias ou até semanas por ser impossível à barca enfrentar a violência do rio.
A PONTE
O pedido formal para que fosse construída a ponte foi apresentado ao rei D. Luís I em finais de 1887, sendo presidente da Câmara de Constância o Dr. Francisco Augusto da Costa Falcão. Esse documento, aprovado em sessão camarária em 14 de dezembro daquele ano, pedia a Sua Majestade a construção de uma ponte no rio Zêzere desta vila, melhoramento há muito reclamado pelos povos deste concelho e dos próximos.
A Câmara de Abrantes, igualmente interessada no empreendimento, secundou o pedido. Moveram-se influências junto dos órgãos de decisão. Personalidades do concelho e da região (designadamente das famílias Falcão e Sommer) empenharam-se pessoalmente no processo.
Em consequência, e ao contrário do que era norma em casos semelhantes, a resposta do Governo foi muito rápida: apenas cinco meses mais tarde, em maio de 1888, já se faziam estudos para a execução da obra. Um ano e meio depois teve lugar a adjudicação dos trabalhos à empresa construtora – a Empreza Industrial Portugueza, de Santo Amaro, Lisboa, como reza a placa metálica afixada a meio do tabuleiro – e as obras começaram logo a seguir, em 1890. Em apenas dois anos a ponte estava pronta. Corria o ano de 1892.
Visita Real
Com os seus 200 metros de comprimento e 23 de altura, a ponte do Zêzere era, aos olhos dos constancienses de então, mais do que aos de hoje, uma obra de grande envergadura. Apesar disso, não consta que tivesse sido oficialmente inaugurada nem sequer se conhece a data certa em que foi aberta ao trânsito.
A verdadeira consagração da ponte verificou-se quatro anos depois da sua construção, quando o rei D. Carlos, acompanhado da esposa, a rainha D. Amélia, e do herdeiro da coroa, o príncipe D. Luís Filipe, esteve na vila em 8 de maio de 1896. Nessa ocasião, a ponte foi devidamente engalanada para receber, com a dignidade que se impunha, o cortejo real.
Embora a fotografia fosse ainda uma relativa novidade entre nós, o fotógrafo desta vez estava lá e fixou para a posteridade a belíssima imagem que aqui reproduzimos e que constitui uma importante peça do património documental de Constância
INFO e TEXTO: