Anjo da Desgraça (hallowed be thy name) Letterbox Hybrid

Ainda estou vivo. Já mal me recordo do dia em que adormeci para este pesadelo. Sei que tudo passou muito rapido y que a minha voz de nada serviu. Sei que a Morte esteve presente y que eu não a impedi. Sei também que isso reúne culpa suficiente para me condenar a mim mesmo. Mas porque me condenam eles? Não fui eu que A chamei nem fui eu que lhe dei a alma perdida... Eu simplesmente não fui capaz de evitar essa desgraça. E que desgraça... Mas para eles eu sou o culpado y por isso vivo este pesadello.
Serei o Anjo da Desgraça. Não tarda não serei mais do que matéria morta e putrephacta.
Sou um condenado a pena capithal y como tal prenderam-me na enxovia de Santa Rita. Masmorra de criaturas que não pertencem a este mundo. Um verdadeiro inpherno. Por lá não vivi, antes penei, agrilhoado como um animal.

Houve um dia em que desceu uma criatura dos céus também ela presa sem saber porquê. Essa criathura não era do nosso mundo. Era um ilusttre escritor. Chamavam-lhe de Camilo. Nesse descendimento ao inpherno da Relação viu-me y disse-me “Deus esteja contigo”. Creio que era o Anjo da Paciência. Não me lembro de muito mais... sinto-me demasiado perturbado. Sei que ele privou com o carrasco. O carrasco é o executador da justiça. Aquele que vai puxar o banco y estender a corda no meu pescoço.
O carrasco também é um preso. Mas ele podia deslocar-se ao pathio, local onde passa o cano de água limpa. O privilégio daquele que ceipha as vidas. É um carpinteiro e também ele fora destinado à forca. Ofereceu-se para carrasco y com tal opherenda as mortes encharcam a sua alma y a pena capithal não lhe é aplicada.

Esse carrasco é uma criatura do mesmo inpherno. Mas ele arrastava-se por entre trabalhos em madeira na enxovia de S. Vítor. Entre a madeira, aquela que nos vai envolver como se se tratasse do papel a que dá origem... Era lá que ele ficava semi-agrilhoado.
O meu chegou. Eles retiraram-me da enxovia pelo alçapão enquanto as outras criathuras me lançavam as suas garras. Um pouco do meu eu reviveu quando me retiraram daquela jaula demasiado atestada por crueldade.
Cheguei a um mundo diferente. Para lá chegar basta subir pelas escadas até ao segundo piso. É subir as escadas acompanhado por uma quase escuridão até a luz invadir o olhar. Bastou subir até lá para me sentir mais perto do céu. No segundo piso o carrasco ignorou a sala daqueles que aplicam a justiça. Se a minha voz não fez efeito quando cá vim pela primeira vez, também nesta alttura o meu sentido de visão se desphez e nada vi. Sei que ele virou à direitta, na direção contrária dessa sala. Entramos y vi uma portta grande, vermelha, toda revestida a pedra, com um gradeamento por cima. Percebi logo que seria aquele o meu destino. O destino do condenado que tem apenas mais uma noite neste mundo.

Escrevo esta missiva nesta minha última divisão. Estou tão perturbado... mas este local dá-me alguma lucidez para escrever estas palavras finais. Já não me sinto como na enxovia, a jaula inphernal... Eles querem que me redima nesta última noite mas não sei por quem me redimir... Estou perturbado, tão perturbado! Aqui já não se respira aquele ar phétido ao qual me habitei na enxovia, mas também ninguém pode cá entrar a não ser que seja para passar a sua última noite. A porta fica fechada y no ar sente-se a morte.
A hora aproxima-se... continuo a acreditar que vivo uma ilusão. Tenho um pedaço de pão e ainda uns tragos de água y umas lágrimas para acompanhar tão abasttada repheição. Sem dúvida um privilégio. Se estivesse na jaula do inpherno nem as minhas lágrimas teria para mim.
Este é o quarto dos privilegiados: o quarto de preparação para a morte. É como lhes chamam... a capela dos réus complacentes.
Mas digo-vos, eu mesmo me condenei a mim mesmo! Foi a minha razão de viver que a Morte levou. Y eu nada consegui fazer para o evitar. O meu tormento é não conseguir acender uma vela por ela... Não me deram tempo de acender a luz pela sua alma. A minha voz foi logo abaphada y as mãos agrilhoadas. Por isso enquanto espero pela minha hora... lembro-me das palavras do escritor y escrevo esta missiva. O meu desejo é que ele a leia y acenda a vela por mim.

Ouço vozes de mulheres y crianças aqui ao lado... Perto da subida aos céus. Esse escritor está acima de mim... Ele é um ilustre y por isso tem direito a um quarto de malta. É no terceiro piso que essas divisões ficam... São 8. O dele tem uma vista fantástica segundo diziam... S. Joao bendito. O que eu não daria para olhar uma última vez para a Santa Sé...
Eu sou um condenado à morte tal como todos vocês. Para mim, contudo, as areias do tempo começam a escassear. Os que me condenaram assumiram a sentença que impus à minha alma y a mim mesmo como a sentença do meu corpo y da minha vida. Y para eles tenho um calendário a cumprir: não às habituais 5 horas... à 1 hora. Eles vão-me levar para a forca.
Ele sabe que me vão colocar um capucho para me taparem durante o percurso.
O meu desejo é que esta missiva seja entregue ao ilustre escritor do quarto de malta. Talvez ele perceba as minhas palavras y consiga acender ou mandar acender uma vela por mim. Ele mesmo estando preso tem um criado para o servir y, de qualquer forma, em breve estará em liberdade. Ele sabe que sou filho de Deus Y sabe que à 1 hora deixarei de ser homem deste mundo. O destino é essa hora e o caminho é sagrado
Ele saberá. Ele tem a vista do céu y tudo vê. Y que vista... Ele vê a santidade y a natureza em seu torno. Ai Santa Sé! Junto da santidade e por cima da sombra daquelas frágeis árvores está o cavaleiro e junto dele está a fonte do anjo. A luz guia toda uma outra vista no final. Ela partiu y por ela também eu parto em sua direção... À 1 hora deixarei de ser homem deste mundo.