Na idade média, a Ribeira de Coina era navegável até à Aldeia da Piedade, ou “Coina-a-Velha”, como é conhecida por muitos. Neste local, ainda hoje são visíveis ruínas de um castelo e a toponímia Estrada Porto de Cambas, que remete para a existência deuma estrutura portuária.
Esta mesma ribeira, que nasce na Arrábida e desagua no Tejo, e teve uma importância histórica no transporte de pessoas e mercadorias, passa pela freguesia da Quinta do Conde, onde desenha os limites do concelho de Sesimbra e a sua fronteira com Setúbal. Foi exactamente nos terrenos contíguos à
ribeira, que surgiu o Parque Ecológico da Várzea, assente num conceito sustentável de recuperação da paisagem e dos valores naturais existentes.
Os primeiros passos
Foi a partir de 2010, Ano Internacional da Biodiversidade, que a Anime - Projecto de Animação e Formação, associação da Quinta do Conde, propôs a criação de um corredor ecológico que abrangesse toda esta zona.
A ideia foi bem recebida pela Câmara Municipal e pela Junta de Freguesia da Quinta do Conde e iniciou- se então a limpeza do terreno que levou à remoção de várias toneladas de detritos depositados ilegalmente ao longo dos anos.
Este trabalho deixou compreender, pela primeira vez, em muitos anos, os contornos e a beleza da paisagem original, assim como a sua flora e fauna. Na sequência desta operação foram abertos canais e represas para criar planos de água, que funcionam como sistema de drenagem. No inverno, a água em excesso é escoada e no verão, quando o caudal é menor, é retida.
Com o surgimento destas zonas de água começam a aparecer, a pouco e pouco, novas espécies vegetais e animais. O Parque associou-se, então, a várias campanhas de reflorestação e recebeu cerca de 2 mil árvores. As primeiras já impõem a sua presença na paisagem, enquanto as mais recentes estão devidamente sinalizadas e protegidas.
A participação, tanto individual como de grupos formais e informais e empresas, foi decisiva para este arranque e cimentou um vínculo comunitário que os responsáveis pelo Parque, Câmara e Junta incentivaram desde a primeira hora.
As hortas urbanas
Por ser uma zona de alagamento, onde os terrenos, por norma, são férteis, começaram a surgir hortas urbanas e houve necessidade de regulamentar esta actividade em função do futuro Parque. Foi então apresentada uma candidatura à EDP Solidária, que resultou no financiamento de cerca de 60 talhões de hortas, distribuídos por associações locais e cidadãos com poucos recursos económicos. Estas hortas são hoje o “coração” do Parque, e possibilitam uma ocupação humana permanente.
Para além da sua função social têm tido também uma relevância pedagógica pois permitem que os mais novos tenham contacto com a agricultura em modo tradicional. A Mãe d’Água, ou nascente, que foi encontrada durante os trabalhos de limpeza contribuiu decisivamente para a implementação deste projecto.
Equipamentos
Ao mesmo tempo foram criados equipamentos de apoio, como o Centro Agrícola e Ambiental, onde hoje funciona um pequeno laboratório coordenado por uma bióloga da Anime, que desenvolve actividades para os mais novos, as casas de apoio aos hortelãos, a estufa, os viveiros de plantas autóctones, o parque de merendas, o pequeno anfiteatro numa zona de bosque, os percursos interpretativos, os observatórios de aves e de abelhas e a zona do pontão, o ex-líbris do parque, onde é “obrigatório” tirar uma fotografia.
Deste ponto pode contemplar-se a várzea em toda a sua extensão e beleza, observar várias aves que não eram vistas há vários anos na Quinta do Conde,
e ouvir o som das rãs que habitam as margens.
O associativismo
A dinâmica que tem sido gerada atraiu várias associações locais que, apesar de desenvolverem actividades em diferentes áreas, têm, na maioria dos casos, um talhão nas hortas e uma presença regular e activa no Parque.
O Centro Comunitário da Quinta do Conde, que faz visitas com utentes idosos e crianças, a Ecos d’Arte e a Kaminhos Kom Sentidos, que desenvolvem actividade artística, a Migravida e o Fundo de Apoio Social de Cabo-Verdianos em Portugal, associações de imigrantes dos países de leste e de Cabo Verde, são alguns destes exemplos. No caso da Control Line Portugal, a associação aeromodelismo de voo circular tem a sua sede no CIPA. No Parque da Várzea
gere uma pista de voo homologada, que já recebeu três provas internacionais, e uma escola da modalidade, que funciona aos Sábados.
Um dos projectos mais interessantes neste campo é posto em prática pela Associação de Apicultores da Península de Setúbal, que tem uma colmeia-escola no espaço, que para além de permitir que os visitantes se vistam de apicultor e descubram os segredos da produção do mel, ajuda os hortelãos pois as abelhas fazem a polonização de espécies como a beringela ou a melancia.
Por fim, a Anime, associação que acreditou desde o início na criação deste parque é responsável pela sua gestão, limpeza, manutenção, estudo da biodiversidade, divulgação, contactos para parcerias e desenvolvimento da oferta educativa.
Hoje, o Parque Ecológico da Várzea é uma realidade e desperta o interesse de muitos visitantes, tanto da freguesia da Quinta do Conde, como de todo o concelho e mesmo dos municípios vizinhos. Até aqui, o público escolar tem tido um papel de destaque mas são cada vez mais as famílias que optam por este espaço para passeios, piqueniques ou outras actividades com forte ligação à natureza, como o Festivárzea, festival dedicado à biodiversidade, que se realiza em Junho, e as Ecoférias, programa de ocupação de tempos livres durante as pausas escolares.
O Parque Ecológico está aberto todos os dias e a entrada é gratuita.