Uma mercearia, tal como esta foi entre os anos cinquenta e oitenta do século passado, é uma pequena loja tradicional que vende produtos dos mais variados géneros, sobretudo alimentos, podendo complementar a oferta com produtos de higiene, bebidas e objectos de uso doméstico. Um merceeiro, dono de uma mercearia, armazena diferentes tipos de alimentos de várias proveniências para venda a retalho.
Nos anos cinquenta do século passado existiam algumas mercearias pela cidade, que procuravam dar resposta às necessidades de consumo da população. Os produtos nesta época eram manipulados pelos merceeiros que os retiravam das tulhas, dos sacos, dos caixotes, das latas de grandes dimensões, donde eram retirados com corredoras de dimensão adequada, geralmente de alumínio, mas também as havia em latão, folha-de-flandres e zinco, ao contrário de hoje, em que os produtos que adquirimos são vendidos na sua grande maioria em embalagens individuais estanques. Por exemplo, comprava-se sempre açúcar louro, o qual era fornecido ao cliente dentro dum cartuxo de papel acinzentado. O caixeiro batia o cartuxo em cima da pedra mármore do balcão, a fim de o açúcar assentar e com recurso a uma corredora, deitava ou retirava mais uma pitada de açúcar ou duas, até a balança indicar o peso pretendido.
Assim se pesava também o sal, a farinha, o arroz, o grão, o feijão e o café. Só que neste último caso, o aroma começava logo ali a povoar-nos as narinas e a revelar ou não a sua qualidade. A manteiga e a banha de porco eram retiradas de latas grandes, com o auxílio das respectivas espátulas e eram pesadas em papel vegetal, com o qual se fazia o embrulho. O azeite era aviado em garrafa levada de casa pelo cliente e medido e tirado de um bidão, com o recurso a uma bomba de dar à manivela.
As especiarias (pimenta, cravinho, cominhos, noz moscada, colorau), as bolachas, eram fornecidas às mercearias em caixa, forrada a papel vegetal.
Dali eram retiradas com uma pinça metálica, na quantidade pretendida e enroladas em papel de chá ou acomodadas num cartucho.
Enlatados, levavam-se para casa: atum “Tenório”, "Catraio", sardinhas em azeite “Tricana” e salsichas “Frescata”. Embalados, levavam-se caixas grandes de fósforos “Clube”, a fim de serem usados na cozinha, assim como farinha “Amparo”, “Predilecta” ou “33”, para adicionar ao leite do pequeno-almoço.
Para a higiene pessoal compravam-se sabonetes de glicerina ou “Musgo Real”, assim como "Pasta Medicinal Couto”.
Para a lavagem da roupa e para fazer barrelas, levava-se sabão azul e branco ou sabão macaco, vendidos à barra. Se não queríamos uma barra inteira, o caixeiro cortava com mestria, o peso certo de sabão.
Feito o avio, pelo próprio cliente ou por empregado enviado com o rol, havia a possibilidade da entrega em casa. Era usual o dono da mercearia ter um moço de recados, que ajudava nas lides da loja. Assim, era comum ir entregar os grandes avios à casa dos fregueses, bem como ir buscar mercadorias à estação da CP para a mercearia.
Era comum o pagamento ser fiado, o “Livro dos Fiados” era uma instituição que vigorava nas antigas mercearias, no tempo em que toda a gente tinha vergonha. Ou porque o chefe de família não tinha recebido ainda o magro salário ou por dificuldades económicas, os avios que as carências da época não permitiam satisfazer imediatamente, mas que a honra de cada um avalizava que seriam pagas, o que infalivelmente era feito, no mais curto espaço de tempo possível.
Com o passar dos anos, com a modernidade, com o aparecimento e proliferação das médias e grandes superfícies, o pequeno comércio entra em declínio, vão fechando e desaparecendo…