Esta lenda surgiu aquando da passagem de jovens estudantes pela
Mourisca provindos da Universidade de Coimbra. Como se sabe, a
Universidade de Coimbra foi a primeira Universidade a ser criada em
Portugal. Como tal, muitos jovens lá estudavam. Numa altura em que
ainda não existia a Estrada Nacional n.º 1, tal como nós a
conhecemos, estes estudantes viam-se forçados a passar pela estrada
então existente: a Estrada Real de 1ª Classe, que deu
posteriormente origem à “Via Mourisca”. Foi então neste
contexto que se desenrolou a referida história.
“A lenda de Pilatos” ou “A lenda dos ossos de
Pilatos” foi-nos contada pelo senhor António Pereira,
história esta que vamos agora transcrever exactamente como nos foi
contada, para que a história original não seja adulterada: Dado que
a única Universidade Portuguesa só existia na cidade de Coimbra, e
como a estrada real passava pela Mourisca, era por ela que os
estudantes, que residiam no Norte, tinham de passar quando iam de
férias para casa ou quando, no final das férias, regressavam à
Universidade, a fim de retomarem os seus estudos ou de os iniciar.
Havia na Mourisca muitos ferreiros que, artesanalmente, faziam as
tachas para pregarem tamancos ou cravos para ferrar o gado, quer
bovino quer cavalar, uma vez que nesse tempo o transporte era quase
todo feito por estes animais.
Usavam os ferreiros, por motivo do seu próprio trabalho, uma
vestimenta muito rudimentar, velha, rota e suja, o que motivava por
parte dos estudantes muitos e variados comentários de troça,
metendo-se às vezes com os ferreiros que, usando as vergas de ferro
aguçadas, perseguiam os estudantes que se punham em fuga com os
seus cavalos. Disse ainda a minha bisavó que se constava na
Mourisca que os estudantes raptaram uma vez uma donzela cá na
Mourisca e que, depois de se terem satisfeito fisicamente, a
abandonaram, não muito longe do lugar.
Para maior acirração, na passagem seguinte dos estudantes pela
Mourisca, vinha então um deles à frente de todos os outros cerca de
30 metros, com uns grandes cornos de carneiro atados na testa, ao
mesmo tempo que apregoava: “ quem quer comprar que eu vendo
barato!”. Respondiam os seus próprios colegas: “vai
vender lá mais para a frente, porque aqui já todos têm!”.
Este acto enfureceu os ferreiros de tal maneira que resolveram
vingar-se dos estudantes na próxima passagem. Se bem o pensaram,
melhor o fizeram.
Na passagem seguinte dos estudantes pela Mourisca, estava tudo
preparado para que não se visse ninguém nas ruas do lugar, nem se
ouvissem os ferreiros a trabalhar. Estava assim montada a armadilha
e os estudantes, embora desconfiados mas confiantes, foram entrando
pelo lugar dentro. Quando já estavam mais ou menos a meio do lugar,
começaram a ouvir-se uns assobios de vários lados ao mesmo tempo.
Tentaram os estudantes fugir, colocando os cavalos a galope, mas os
ferreiros, surgindo de todos os lados com as vergas de ferro
aguçadas, conseguiram apanhar um que, espetado por todos com as
vergas, veio a falecer e cá foi enterrado. Este estudante teria de
apelido Pilatos.
Enquanto, naquele tempo, a família soube e não soube,
passaram-se vários meses e quando a Guarda Real veio fazer
perguntas, ninguém tinha visto nem sabia de nada. Alguns anos mais
tarde veio cá a família do dito estudante dizer que não queria
fazer mal a ninguém, mas que lhe dissessem onde estava enterrado o
Pilatos para o levarem para o jazigo da família, na sua terra
natal. Mas a resposta foi a mesma dada à Guarda Real: ninguém tinha
visto nem sabia de nada.
Daí para a frente se algum estranho, ao passar pela Mourisca,
perguntasse onde é que estavam enterrados os ossos de Pilatos, era
certo e sabido que era corrido e insultado. No meu tempo de
juventude, ainda conheci na Mourisca a Sr.ª Luiza Saraiva, mais
conhecida pela Luiza Laropa ou Laropinha, que se fosse perguntada
pelos ossos de Pilatos, dava uma resposta capaz de fazer corar as
palavras dentro do próprio dicionário.
texto inserido no trabalho A considerada região do Vouga,
trabalho de pesquisa do Grupo Folclórico da Região do Vouga
A CACHE Container micro, com logbook e cachenote.
Pede-se descrição na procura e no registo do log. Pois apesar de
ser uma zona calma há sempre um ou outro olho mais atento a
desconhecidos na zona.