Do livro de óbitos de Vila da Rua, relativo ao ano de 1845, na fls. 43 consta o seguinte assento:
“Aos oito dias do mês de Maio de mil oitocentos e quarenta e cinco, n’esta vila da Rua, freguesia de S. Pelágio, faleceu em uma Forca “…” situada na dita vila, Manuel Pires, casado com Rita de Jesus, ambos do lugar de Vide, desta mesma freguesia, por sentença dada pelo meritíssimo Juiz do Direito de Moimenta da Beira, confirmada pela relação do Porto e não modificada por sua Magestade; constando de cinco mortes todas de uma casa e família, praticadas na dita vila da Rua; seu corpo foi reclamado no acto da sua morte por sua mulher, que lhe mandou fazer ofício de corpo presente, no dia nove do dito mês e anno. Está sepultado na Igreja Matriz desta mesma freguesia, e para constar fiz este assento; dia, mez e ano supra. O pároco – Manuel Pereira”.
Manuel Pires, talhante de carne fresca em Vide, foi apenas um dos muitos bandidos que, à sombra das lutas políticas, cobriram de terror o norte das Beiras.
Uma noite apareceu em Carapito, na casa do lavrador rico José Bernardo Gomes e, entre outros mimos, recortou-lhe a sola dos pés para o obrigar a entregar-lhe o dinheiro; e no dia seguinte, pela manhã, com a maior desfaçatez, apareceu-lhe de novo em casa, levando ao ombro como aviso, a arma que lhe roubara e entregando ao Bernardo Gomes uns frangos que como amigo lhe trazia, pois soubera que fora maltratado pelos ladrões naquela mesma noite.
Foi também entre Carapito e Aldeia, ao tempo que a grande via de comunicação com Viseu, que o Pires da Rua matou Leandro, seu colega de profissão, com talho na Rua, numa fresca madrugada de Fevereiro de 1839. Cortou-lhe as orelhas que pendurou na sua balança, em Vide e, sardonicamente as mostrava aos fregueses perguntando se não queriam comprar orelheira. De modo mais ou menos bárbaro, mais ou menos cobarde, foi liquidando mais quatro pessoas da família de Leandro; motivos… uma rapariga de Penso.
O ciúme animado pelo clima de guerrilha que então se vivia desenvolveu nele o atrevimento feroz e a crença ingénua de que os seus quadrilheiros o haviam de proteger das mãos da Justiça. Por eles esperou em vão, mesmo até ao último instante daquele 8 de Maio de 1845, em que os prados verdes de Primavera vieram executar na forca, um dos últimos condenados à morte em terras de Portugal.
A pena de morte foi abolida em Portugal em 1852 para crimes políticos, em 1867 para crimes civis, sendo apenas em 1911 para todos os crimes, incluindo os militares.
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