A escuridão começou a ganhar contornos mais claros, lentamente as poucas cores à minha volta ganharam intensidade. O cinzento deu lugar a fios de luz que entravam do exterior. Comecei a sentir frio, muito frio, de tal modo que não sentia o corpo. Mexi os dedos e senti as cordas ásperas que me prendiam as mãos. Finalmente consegui ouvir. Ouvia o vento gélido assobiar pelas frinchas das janelas. Não sabia onde estava nem como tinha ido ali parar, tremia, tremia muito. Um nó na garganta dificultava-me a respiração, estava aterrorizado e pronto para gritar quando de súbito ouvi passos, não sei onde, mas estava a ouvir alguém a caminhar. Parou! Da surdina foram-se tornando mais nítidas as vozes dos meus captores!
- Então é assim, aquele vai ter que ser interrogado pelo chefe.
- O que é que ele fez?
- É espião, trabalha para o MI6 e estava em Portugal a investigar as nossas rotas de contrabando.
- Mas como é…
Um toque de telemóvel interrompeu a conversa. Um dos meus captores atendeu:
-Sim, Iuri, está feito. Tenho-o no Cabeço Santo! Exactamente, é onde há o problema electromagnético! Sim, epá, tens as coordenadas, chegas aqui pegas no gajo e leva-lo contigo, há um aeródromo aqui perto, o aeródromo do Casarão. Estará lá um avião que vos levará até à Argélia . Sim, portanto, para sair tens que abrir o descodificador. Andas pela casa e tens indicações que te dizem como abrir… Mas atenção que há dois tipos, umas estão mal e outras correctas. Das correctas só há 3. Será assim tão difícil? Pronto, depois de abrires, escreves o teu nome ou nick e de quem estiver contigo… Obvio não é! Se não escreveres o nome não sais mais daqui! Ficas aqui às voltas dentro da mata, e olha que pelo que ouvi dizer isto não é brincadeira, ainda por cima à noite! Já ouvi falar de criaturas um bocado esquisitas e cenas assim. De inicio parecem-te pequenos animais inofensivos, mas rapidamente te saltam em cima. Ainda o ano passado um associado nosso não ligou ao fluxo electromagnético e olha, passados três meses apareceu o cordão de ouro que tinha no pescoço perto do cemitério de uma aldeia ali em cima. O mato é denso, e começas a andar às voltas, rapidamente entras em parafuso. É demência pela certa! Mas pronto, adiante! O gajo está aqui, leva-lo e quando chegares à Argélia, ligas-me! Não... não te preocupes com a policia, xau!
Estou feito! Como é que eles sabem? Tenho que sair daqui, senão enfrento um interrogatório à moda antiga na Argélia!
- Chefe, então está tratado? A que horas vêm o Iuri buscar o gajo?
- Ele disse que estava a entrar em Vilar Formoso, não deve demorar muito! Vá, vamos embora que está para cair a noite e gosto pouco de andar neste bosque depois do sol se pôr!
Eles caminharam um bocado e depois de alguma conversa que não consegui entender, saíram. Ouvi uma carrinha pegar com algum esforço, um arranque fugaz do motor e em segundos voltei ao vazio... Caí num pranto! Não sabia onde estava, nem quanto tempo tinha até vir o tal Iuri. Tinha a cabeça às voltas, tudo estava a ficar de novo negro, até que me lembrei do pequeno canivete que tinha no bolso. E foi assim que cortei as cordas, procurei as indicações pela casa, abri o descodificador e fugi dali… |