O sítio
Não sei quem colocou
esta cruz aqui, nem porque. talvez esta informação já tenha-se
perdido, mas o lugar convida a parar um pouco, olhar ao
redor e pensar. Pensar sobre o que? cada um usará da
sua maneira o tempo que passará aqui. Convido-te a sentar e
contemplar o um pouco o lugar. Foi o que eu fiz, e daí surgiu o
nome para a cache.
O tempo
O bem mais valioso de nossa época não é o
diamante nem o petróleo, a fórmula da Coca-cola ou o sorriso da
Natalie Portman: é o tempo. Obedecendo à lei da oferta e da
procura, quanto mais escasso ele fica, mais caro nos
é.
Como vocês devem saber, o principal sintoma desta doença
cronica – sem trocadilho - é a ansiedade. Toda manhã,
flagro-me aflito, lavando os dentes, com pressa. Vejo-me batendo os
pés no corredor, enquanto o elevador não chega. Até o segundo que o
cursor do telemóvel leva para piscar, num SMS, permitindo-me
digitar outra letra da mesma tecla, deixa-me
exasperado.
Antigamente, não era assim. Na minha infância, os dias
tinham trinta horas, alguns chegando mesmo a quarenta, se bem me
lembro. Não, não é que eu faça hoje mais coisas do que antes. Já
pensei nisso, mas veja só quantas obrigações eu tinha no passado:
cinco horas na escola, lição de casa, inglês, bateria, natação,
jantar com os pais, toda noite, sem contar os séculos ao vivo ou ao
telefone tentando convencer alguma menina a beijar-me na boca... E,
mesmo assim, ainda sobravam infinitos latifúndios improdutivos,
impossíveis de se ocupar, por mais que assistisse televisão,
tirasse cochilos vespertinos, lesse livros, fosse às casas dos
amigos jogar videogame, falar mal dos outros ou simplesmente juntar
nossos tédios, olhar as paredes e escutar o tic-tac dos
relógios.
Das duas, uma: ou as horas eram mais abundantes do que
hoje, ou, então, tinham uma incrível capacidade regenerativa, que
perderam: a cada duas ou três horas mortas, uma nova hora nascia,
fresquinha, como as células de uma pele jovem.
adaptado de António Prata
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